Senado derruba decreto das armas; texto segue para Câmara 

Decisão pode ser revertida na Câmara, mas medida também enfrenta resistência entre deputados. Após pressionar Congresso em discursos públicos, presidente ligou para senadores na tentativa de mudar votos. STF vai julgar texto semana que vem.

Apesar da pressão do presidente Jair Bolsonaro, o Senado derrubou por 47 votos a 28 os decretos que flexibilizam as regras para o porte de armas no Brasil. Foi a maior derrota imposta pelo Senado ao governo. Antes da votação, Bolsonaro usou redes sociais, eventos públicos e entrevistas para pedir votos. E ligou pessoalmente para senadores. “Não deixe o projeto morrer”, disse nesta terça-feira (18), em dois eventos. 

A decisão pode ser revertida na Câmara dos Deputados, mas o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já sinalizou que a proposta também não deve prosperar por lá. “O governo tem uma defesa do decreto que acho frágil, mas respeito.” A gestão até já estuda um “plano B”. “Temos de buscar uma alternativa, retirar um ponto ou outro, mas manter a espinha dorsal desse decreto das armas”, afirmou a líder no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP). 

Depois do resultado da votação, o presidente Jair Bolsonaro foi ao Twitter e disse esperar que a Câmara não siga o Senado, “mantendo a validade do nosso decreto, respeitando o referendo de 2005 e o legítimo direito à defesa”.  

À imprensa apurou que há duas estratégias em curso no governo: a primeira é de avançar projetos de leis que já estão em tramitação no Parlamento. Um deles seria a proposta do ex-senador Wilder Morais (PP-GO) que permite a posse de arma em toda propriedade rural e não só no imóvel. O texto já foi aprovado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). A outra estratégia é questionar no Supremo a decisão do Congresso de derrubar o decreto. Parlamentares governistas alegam que os decretos legislativos que tentam barrar as modificações discutem o mérito da proposta e a possibilidade de o presidente decidir sobre a questão.  

O ministro da Casa Civil, Onyz Lorenzoni, afirmou “ter certeza” de que o Supremo Tribunal Federal vai julgar, na semana que vêm, procedentes os decretos editados pelo presidente Jair Bolsonaro para facilitar a aquisição, registro, posse, porte e comercialização de armas de fogo. Mas o STF já impôs uma derrota ao governo ao impedir que Bolsonaro acabasse com conselhos criados por lei por meio de um decreto. 

Mas o próprio Bolsonaro já falou nesta terça em uma alternativa, sem precisar da aprovação legislativa: vai determinar ao ministro Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública) que a Polícia Federal não dificulte quem quiser ter armas em casa. “A Polícia Federal está sob meu comando. No Brasil o grande ‘reclamo’ do pessoal do passado era que a PF, na questão de efetiva necessidade, tinha dificuldade (em analisar os casos de porte)… Eu, como presidente, isso vai ser atenuado. Vou determinar ao ministro Sergio Moro.” 

Debate 

Nesta terça, senadores criticaram o modo como as mudanças da regra sobre porte chegaram ao Congresso. “O Senado não se intimida com esse bombardeio de robôs, de maníacos, reacionários, que acham que não é através do diálogo, da lei e da polícia que se resolvem as coisas. Que o senhor Presidente da República arme os policiais, treine os policiais, porque nós não podemos permitir que as pessoas cuidem sozinhas das próprias vidas”, disse a senadora Kátia Abreu (PDT-TO). 

Com base em um parecer jurídico da consultoria do Senado, parlamentares contrários à proposta afirmaram que o Planalto extrapolou suas prerrogativas. O texto, segundo a consultoria, tinha nove pontos inconstitucionais e abria brechas para facilitar o acesso a uma arma.  

Entre esses está o de permitir que pessoas enquadradas em “atividade profissional de risco” e no parâmetro de “ameaça à integridade física” possam ter uma arma, o que inclui até mesmo advogados e jornalistas. 

Antes da votação, dez senadores discursaram a favor e contra o decreto. Entre os defensores estava o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente, que passou o dia telefonando para colegas e fez um dos discursos mais enfáticos em defesa das normas assinadas pelo pai. Flávio afirmou que o Congresso não poderia anular o decreto. “O projeto de decreto legislativo é claramente e flagrantemente inconstitucional.” 

O discurso foi interrompido por uma manifestação do deputado Pastor Sargento Isidório (Avante-BA), que estava no plenário com cartazes com os dizeres “Armas não, livros sim” e angariou votos contrários com uma Bíblia na mão. “Vamos falar para a mulher sendo estuprada que ela pode atirar um livro na cabeça do estuprador e não dar um tiro para defender sua vida e sua integridade física”, disse Flávio, em resposta.  

O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-CE), lembrou que o decreto é uma promessa de campanha. “A defesa de sua política de segurança foi o que permitiu ao presidente Bolsonaro ter a expressiva votação que teve.” 

Antes da proclamação do resultado, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) observou que “para além de qualquer debate, o que está na raiz desta decisão é se este presidente da República pode ou não continuar governando por decreto”. Ele ainda destacou uma postagem do guru do presidente, Olavo de Carvalho, dizendo que “o Parlamento só existe para impedir que a vontade do povo prevaleça”. 

Polícia Legislativa vai apurar ameaças a parlamentares 

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), determinou que a Polícia Legislativa investigue as ameaças relatadas por senadores contrários à flexibilização do porte. Além disso, Alcolumbre ofereceu escolta policial para parlamentares alvo dos ataques e ao fim da sessão se solidarizou com os agredidos. A segurança não havia sido solicitada por nenhum parlamentar até o fim da tarde desta terça. 

“O Senado vai dar todas as garantias para os senadores cumprirem seu mandato, então o que for deliberado para a Presidência que a gente tiver clareza que é uma ameaça, nós vamos autorizar (escola)”, disse Alcolumbre. 

Quatro senadores relataram à presidência da Casa terem sido alvo de ataques: Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Fabiano Contarato (Rede-ES), Eduardo Girão (Pode-CE) e Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB). Depois disso, Alcolumbre emitiu nota expressando “indignação” e prometendo providências para garantir a proteção e a liberdade dos parlamentares. Senadores alvo de ataques afirmam que o episódio só reforçou a mobilização. 

FONTE: Estadão 

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